domingo, 1 de fevereiro de 2015

Para Paulas

Encontramos alguns grandes amores eternos e ao longo da vida, sofremos pela perda ou afastamento de cada um deles. Quando dois grandes amores partem ao mesmo tempo, o corpo e a alma sofrem em demasia...
Sabe quando todos os canais passam filmes ruins e tocam músicas que você não gosta e parece que a sua vida entrou no meio dessa grade de programação inadequada? Até as canetas param de funcionar.
E você sente que está caminhando há muito tempo por uma estrada que nunca chega a lugar algum, mas se consola pensando que, pelo menos, a sua trilha sonora daria um bom songbook.
Então, às três da manhã, comendo pó de gelatina na escrivaninha e olhando a cama tão próxima, você pensa que sempre soube que sempre teve esta cama à sua espera, mesmo quando esteve em outras casas, em outras cidades.
Isso pode parecer banal, mas guarda uma imensidão de significados, desde o seu berço na maternidade, até o seu leito de morte.
Sobretudo, neste momento...
Todos os canais estão ali, basta acessá-los.
Mas as pessoas vão embora e eu nem estou falando do Frank Sinatra e da Nina Simone.
Não que não façam falta. Fazem, mas ainda posso ouvi-los.
Estou falando das pessoas que quero ouvir e abraçar.
Todas as lembranças não bastam.
Aquele momento inicial, andando pelo corredor de mesas até chegar ao bar e as primeiras impressões; histórias engraçadas sobre morder os chinelos; o parto da Alice, depois Emília, Olívia, Pingo...
Delírios engraçados, os cafés que só vc sabia fazer; as idas para Itatiaia, as compras na Savassi, as tranças no BH Shopping, tintas vermelhas para o cabelo e a aposta de quem cortaria primeiro (você perdeu).
Velas, caixas decoradas, bilhetes e chinelinhos deixados na madrugada. Tantas lembranças...muitas fotos também (apesar de você detestar).
Depois, novas histórias. Os testes de gravidez, os nascimentos dos nossos filhos, (hoje tão amigos).
E os dias de festas...réveillons, fantasias, vinhos, músicas, tardes de sol com os Beatles, noites de lua com bolhas, no Jazz Village.
Juntando tudo isso, uns 17 anos...sem brigas.
Teria sido o casamento perfeito se fossemos um casal.
E agora o momento doloroso da segunda despedida.
Caixas, caminhão e etiquetas: transportadora, 3°, edícula, doação.
A despedida na piscina, a despedida e o vinho, o "ver Penedo" da Clara e as balas também.
Alguém me disse "você vai se acostumar". Respondi que não havia conseguido me acostumar na primeira vez, não seria diferente agora.
Na frente desta agenda onde escrevo o texto que não vou esmiuçar e corrigir, entre a caixa "Le Cigar" (que não tem cigarros, aproveitando pra lembrar que você precisa parar de fumar) e a Coruja, estão as 3 lâmpadas que você me deu, dizendo "estão ótimas!". A quarta está no abajur que ilumina o quarto agora.
(Lembra da música do abajur, que não era abajur?)
Olho para as lâmpadas e fico me perguntando se vocês voltarão antes que elas parem de funcionar.
Tomo então uma decisão: instalarei todas. Ligarei e desligarei continuamente pra queimarem mais rápido.
Prometo te dar lâmpadas novas quando voltar.